Ao
abrir os olhos em seu quarto, Bella percebia os suaves raios de sol que clareavam
seu quarto, pelas frestas da janela. Já era de manhã. Esticando seu corpo,
pisava no chão com os pés descalços e se dirigia ao banheiro. Agilmente, tomava
banho, escovava os dentes, penteava seu cabelo escuro, prendendo-o em um rabo
de cavalo, e vestia o uniforme de sua escola, como parte de seu pequeno ritual
matinal. Como sua mãe, Bella sempre fazia questão de estar apresentável.
Estando pronta, ela seguia para o quarto de seu irmão mais novo e, como irmã
mais velha, orientava-o a não se distrair para vestir o uniforme.
Na
mesa, o café da manhã já estava preparado por seus pais, que também estavam
prontos para ir trabalhar no centro da cidade. Bella e Pedro seguiriam para a
escola, pois estudavam de manhã. Bella auxiliava seus pais nas tarefas
domésticas, sempre antecipando pequenos afazeres que facilitavam a organização
e limpeza de sua casa. Ela sempre teve participação ativa no cotidiano de sua
família. Todo o seu universo conhecido estava, de alguma forma, ligado à rotina
de sua casa. O som da água corrente do chuveiro, a visão de Pedro deitado na
cama, enrolado em seu cobertor, sua mãe preparando ovos mexidos e seu pai
tomando café davam-lhe a sensação leve e precisa do funcionamento do mundo.
Sua
escola fica próxima de sua casa, fazendo o caminho de ida e volta, uma extensão
da fluidez em movimentos sonoros de seus dias sinfônicos. Na escola, Bella
demonstrava interesse pelas matérias e atividades desenvolvidas pelos
professores, participando ativamente das aulas. Seus dias comuns são deveras
preenchidos pelo cálculo, pelo texto, pela geografia da escola.
Um
dia, ao ajudar sua mãe na cozinha, Bella observou que a receita de pão de mel
que a mãe sempre fazia satisfazia ela e suas amigas na escola. Quando saia do
forno, o cheiro doce e acolhedor do mel e das especiarias se espalhava pela
casa, trazendo à tona memórias de risos e suas amigas. A partir deste momento, Bella
começou a aprender a arte de fazer pão de mel. A princípio, ela fazia para a
família e os amigos próximos. O gesto, simples, mas repleto de carinho, começou
a ganhar um significado diferente para ela.
Logo,
sua mãe percebeu que Bella estava mais animada e falava sobre a possibilidade
de vender os pães de mel. Sua ideia era usar o dinheiro para ajudar nas suas
pequenas despesas, pois sendo uma adolescente, surgiam necessidades especiais
desta idade. Embora ainda jovem, Bella tinha uma boa vontade própria de
realização, sabendo que poderia fazer os pães de mel, porém, sem deixar de lado
sua rotina escolar e as responsabilidades na sua casa. Bella começou a fazer
mais pães de mel, aprimorando a receita e criando novas versões. Ela embalava
as guloseimas com carinho, sempre com uma fita, um adesivo, e em alguns até
bilhetinhos que tornavam a embalagem tão especial quanto o próprio pão de mel.
As
vendas começaram para amigos e conhecidos. A notícia de sua doçura se espalhou
como um rumor suave, e Bella encontrou mais formas de encaixar a venda de pães
de mel, tornando sua nova atividade mais do que um simples negócio; para Bella,
representava a maneira como ela estava se conectando mais profundamente com as
pessoas ao seu redor. Era uma forma de distribuir carinho, algo que ela já
fazia em sua casa, agora ampliado esta ligação para outros ao seu redor. Bella
não apenas vendia um doce, ela compartilhava uma parte importante de si mesma —
sua dedicação, sua habilidade, seu trabalho e, acima de tudo, seu amor pela
família e pelas coisas da vida. Cada cliente que recebia um pacote de pães de
mel sentia que, por trás daquela simples receita, havia um gesto de gentileza
que fazia o dia um pouco mais doce.
À
medida que os dias passavam, Bella foi aprendendo a equilibrar suas
responsabilidades. Ela continuou a ser a irmã mais velha atenta a Pedro, a
filha que ajudava nas tarefas domésticas e a estudante que se dedicava à
escola. Mas agora, ela também era a menina que vendia pão de mel, uma jovem que
começava a perceber que o valor das coisas não estava apenas no que se recebe,
mas na doçura do que se pode oferecer aos outros.
Em
um certo fim de tarde, quando o sol se inclinava lentamente no horizonte
alaranjado, Bella se pegou olhando pela janela do seu quarto. As cores do céu
estavam vivas, e o cheiro do pão de mel, que ela acabara de tirar do forno,
preenchia o ar. Ela sorriu, sentindo que, de alguma forma, estava mais
conectada ao mundo ao seu redor. Como nas viagens e leituras... Um intervalo
entre os reflexos de seu pensamento e a nítida compreensão da vida que fluíam
como barcos de papel em um tanque d’água numa borda infinita, como um poente
suspenso no ar.
Bella
sentiu que, mesmo nos momentos mais simples da vida, há sempre algo doce a ser
compartilhado.
E,
talvez, seja isso o que realmente importa.
por
João Zanela
Nenhum comentário:
Postar um comentário